O aposentado Genivaldo Andrade da Silva, de 64 anos, preparava uma feijoada em seu apartamento no dia 12 de março, quando começou a sentir tontura. Passava do meio-dia e, naquele momento, ele não imaginava que sua vida estava em risco. Por conta própria tomou um Omeprazol, achando se tratar de algum problema de estômago. Comunicou à filha Juliana Andrade que não estava se sentindo bem e foi ao banheiro, onde desmaiou.
Por decisão da família, foi levado às pressas para a UPA do Jacintinho com fortes dores no peito. Doze dias antes – em 1º de março – a unidade passou a integrar o programa Bate Coração, instituído pela Secretaria de Estado da Saúde (Sesau) com o objetivo reduzir o tempo-resposta e aperfeiçoar o tratamento efetivo do Infarto Agudo do Miocárdio. Genivaldo não sabia disso, mas o programa lhe salvaria a vida.
A enfermeira Gleicy Kelly Athayde de Araújo, que recebeu o aposentado na UPA, lembra que ele chegou à unidade com dor precordial súbita – o que indicaria um Infarto Agudo do Miocárdio com supra de ST, condição médica grave que ocorre quando há um bloqueio repentino do fluxo sanguíneo para uma parte do músculo cardíaco.
Confirmado o infarto com um eletrocardiograma, o próximo passo foi entrar em contato com o cardiologista Clênio Jaques, do Hospital do Coração Alagoano, por meio de telemedicina – um dos diferenciais do programa. “O Bate Coração é uma iniciativa pioneira, que utiliza a plataforma Join, aplicativo desenvolvido pela empresa japonesa Allm para facilitar a comunicação e colaboração entre profissionais de saúde em tempo real”, explica Gleicy Araújo. “Este programa inovador reúne cardiologistas qualificados, disponíveis 24 horas por dia, para discussões online imediatas sobre casos de infarto de supra de ST”, completa.
No caso de Genivaldo, a discussão entre a equipe da UPA e o cardiologista do Hospital do Coração Alagoano chegou à indicação de trombólise, procedimento médico que utiliza medicamentos para dissolver coágulos – trombos – já formados dentro dos vasos sanguíneos. “Após o término da trombólise, houve redução de dor e de supra. Então, o paciente foi transferido para a Unidade de Dor Torácica do HGE”, por meio do Samu, conta a enfermeira.
DE OLHO EM CADA DETALHE
Entre a entrada do aposentado na UPA do Jacintinho e a alta médica no HGE, foram três dias. Nesse período, Genivaldo Andrade, que se diz muito observador, prestou atenção em cada detalhe nas duas unidades médicas, em especial na forma como foi atendido pelos profissionais. “Atendimento excelente, um profissionalismo ímpar. Cada profissional desempenhando seu papel com competência, amor e respeito”, ressaltou.
Genivaldo foi o primeiro paciente cardíaco recebido pelo Bate Coração em uma Unidade de Pronto Atendimento. Em apenas 22 dias de funcionamento, o programa, presente em 28 unidades de saúde do estado, incluindo UPAs e hospitais regionais, já salvou a vida de seis pessoas. Apesar de pouco tempo de instituído, tem despertado o interesse de profissionais de saúde de outros estados.
No início de fevereiro deste ano, representantes da Secretaria de Saúde de Sergipe vieram conhecer o projeto alagoano, que na época estava em vias de implantação. Para o secretário executivo de Saúde de Sergipe, Vinicius Vilela, Alagoas tem apresentado uma evolução técnica, que serve de exemplo para outras unidades da Federação. “O sistema implantado em Alagoas é eficiente e financeiramente viável, oferecendo um atendimento qualificado e célere para pacientes do SUS”, destacou.
SALVAR VIDAS
O diretor do Hospital do Coração Alagoano e coordenador do programa, Otoni Veríssimo, informou que o Bate Coração custou ao Estado R$ 250 mil, um valor relativamente baixo em se tratando da importância do projeto. “O investimento em tecnologia tem sido uma marca da gestão estadual de saúde em Alagoas. O Governo do Estado, na figura do governador Paulo Dantas, tem como norte o investimento em tecnologia para assegurar o melhor atendimento à população”, disse.
Segundo a Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC), cerca de 14 milhões de brasileiros têm alguma doença no coração e cerca de 400 mil morrem por ano em decorrência dessas enfermidades, o que corresponde a 30% de todas as mortes no país. “As doenças cardiovasculares são um problema de saúde pública mundial. São mais de 18 milhões de óbitos no mundo decorrentes dessas doenças prevalentes. No Brasil, representam as principais causas de mortes. Estima-se que até 2040 haverá um aumento de até 250% dessas ocorrências no país. A cada dois minutos, uma pessoa sofre um Acidente Vascular Cerebral (AVC) ou um Infarto Agudo do Miocárdio”, informa a SBC.
Para o diretor da UPA do Jacintinho, Nery Almeida, o Bate Coração representa um avanço significativo na capacidade de fornecer cuidados cardíacos de alta qualidade e oportunidade aos pacientes que sofrem de infarto de supra de ST. “Estamos confiantes de que esta iniciativa não apenas melhorará os resultados clínicos, mas, também, elevará o padrão de excelência em nossa instituição”, disse.
TESTE PARA CARDÍACO
E no último dia 20, cinco dias depois de ter recebido alta médica, o aposentado Genivaldo Andrade vestiu o uniforme do Bahia, seu time do coração – desculpem o duplo sentido – para ver o jogo contra o arquirrival Vitória, pela Copa do Nordeste. O Vitória até saiu na frente, mas o time do aposentado venceu a partida de virada, por 2 x 1.
“Não foi um grande jogo e eu nem estava torcendo tanto assim. Mas, que bom que ganhamos”, disse Genivaldo à reportagem, no dia seguinte, ainda vestido com a camisa do Bahia. Pode não ter sido um grande jogo, mas foi, literalmente, um teste para cardíaco.