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O Hospital Escola Dr. Helvio Auto, unidade assistencial da Universidade Estadual de Ciências da Saúde de Alagoas (Uncisal), referência em doenças infectocontagiosas no estado, se engaja na luta da Semana Mundial de Conscientização sobre a Resistência aos Antimicrobianos, comemorada de 18 a 24 de novembro, e alerta a população para os cuidados necessários sobre o perigo de se usar antibióticos sem prescrição e orientação médica. A data foi instituída pela Organização Mundial da Saúde (OMS) para melhorar a conscientização e compreensão da resistência antimicrobiana por meio de comunicação, educação e treinamento eficazes.

 

A resistência aos antimicrobianos representa uma grande ameaça global para pessoas, animais, plantas, alimentos e meio ambiente. Ela ocorre quando bactérias, vírus, fungos e parasitas mudam com o tempo e não respondem mais aos medicamentos, muitas vezes por mau uso da substância. Isso torna as infecções mais difíceis de tratar e aumenta o risco de propagação de doenças, muitas delas graves, gerando mortes que poderiam ter sido evitadas.

 

Pensando no impacto que o mau uso de antibióticos pode ter na saúde da população, preparamos um especial com perguntas e respostas sobre o tema com o infectologista e professor Fernando Maia:

 

Qual a importância dos antibióticos para a prática médica?

 

Os antibióticos são uma arma muito eficiente para tratamento de infecções que muitas vezes eram fatais, e que ainda hoje continuam sendo fatais se não forem tratadas de forma adequada, de modo que na hora de escolher um antibiótico o médico já deve saber qual a bactéria que está causando aquele quadro e onde está localizada a infecção. A partir daí então a gente vai escolher o antibiótico de acordo com o perfil de sensibilidade, saber se aquele antibiótico funciona para aquela bactéria, e qual o local do corpo que aquele micro-organismo está instalado.

 

Qual a conduta adequada para o profissional adotar um antibiótico num tratamento de saúde?

 

Na hora de escolher um antibiótico, é muito importante que o médico saiba qual é a provável bactéria. Na maioria das vezes, a gente pode recorrer à cultura bacteriana, porque a cultura identifica exatamente qual é a bactéria que está causando aquela infecção e um exame auxiliar que é feito a partir da cultura positiva, que é o antibiograma, também vai dizer qual é o perfil de sensibilidade aos antibióticos e resistência daquela bactéria que foi isolada.

 

A má conduta no uso de antibióticos é o principal responsável pelo desenvolvimento das ‘superbactérias’?

 

O surgimento das chamadas superbactérias ocorre por vários fatores, um fator importante é o uso indiscriminado de antibióticos, então se usa ainda no mundo, não só no tratamento das pessoas, mas usa-se, por exemplo, ainda muitos antibióticos na agricultura, usa-se na pecuária, para evitar certas infecções nos animais e nas plantas que possam prejudicar o crescimento e consequentemente reduzir a produção. Esses antibióticos que são usados em larga escala também na indústria contribuem fortemente para o surgimento dessas bactérias multirresistentes. Aliado a isso, o uso indiscriminado pelos próprios médicos e pela população em geral faz com que venha surgindo nos últimos anos, e cada vez mais frequente, esse problema das superbactérias.

 

O que acontece com nosso corpo quando usamos um antibiótico que não é indicado para aquela infecção?

 

Quando se usa de forma inadequada você não vai conseguir controlar aquela infecção. Por exemplo, uma infecção está localizada no sistema nervoso central, causando meningite. Se você usar um antibiótico que não penetra no sistema nervoso central, mesmo que a bactéria seja sensível a ele, não adianta usar. Você vai apenas selecionar bactérias resistentes àquele antibiótico que você não está conseguindo tratar de forma adequada.

 

Quais são as bactérias mais comuns que desenvolvem resistência a antibióticos?

 

Várias bactérias, nos últimos anos, têm mostrado uma grande capacidade de se tornarem resistentes aos variados antibióticos. O Staphylococcus Aureus e a Pseudomonas Aeruginosa são dois exemplos de bactérias que têm se tornado multirresistentes a quase todos os antibióticos. Existem outras, por exemplo, a KPC, que é a Klebsiella Pneumoniae, que tem uma característica de ser resistente até a grupos de antibióticos mais potentes. Uma bactéria comum que causa infecção urinária, por exemplo, a Escherichia Coli, nos últimos anos também tem mostrado um perfil de resistência crescente.

 

Existe o perigo de superbactérias comuns em ambientes hospitalares atingirem pessoas fora desse ambiente?

 

Essas bactérias hospitalares, as chamadas superbactérias, podem se disseminar em um ambiente, mas dificilmente elas vão causar epidemias, surtos e mortes fora do ambiente hospitalar. De uma maneira geral, essas bactérias super-resistentes não são muito agressivas, porque quanto mais mutações a bactéria sofre, menos agressiva ela se torna. O problema é que ela acomete indivíduos com saúde comprometida, indivíduos com baixa de imunidade, com doença debilitante, indivíduos transplantados, por exemplo.

 

A legislação adotada pelo Brasil para venda controlada de antibióticos é comum em outros países?

 

O Brasil foi um dos últimos países do Ocidente a adotar o controle antimicrobiano. Há muitos anos que, por exemplo, na Europa, nos Estados Unidos, a venda de antibióticos ocorre apenas com retenção da receita médica. E nesses países, o médico deve prescrever a quantidade exata de comprimidos, ampolas ou de cápsulas que o paciente vai usar, de modo que não haja sobras. Aqui no Brasil já foi adotada essa política de controle, mas infelizmente ainda se consegue, em muitos lugares, comprar antibióticos sem receita, ou ainda se consegue comprar antibióticos, por exemplo, com a quantidade maior do que a que foi prescrita, maior do que é necessário e acaba sobrando antibiótico, que muitas vezes é utilizado em outras infecções por pessoas diferentes da família sem nenhuma orientação médica, o que acaba complicando as coisas.